quinta-feira, 26 de janeiro de 2006

Lugares Vazios



Belém, lugar mítico para a infância de muita gente nascida e criada nos subúrbios desta Olisipo sempre virada para um rio que a quer deixar no Mar. Foi lá que muita gente comeu o seu primeiro gelado, que se deram os primeiros chutos na bola de "catchú" contra balizas feitas de troncos de árvores ou pedras da calçada arrancadas do passeio. Foi lá que outros tantos levaram as primeiras namoradas procurando que o romantismo de um rio quase mar fizesse tremer-lhes o estômago de desejo por mais um beijo. E foi lá que muitos mais velhos contemplavam toda esta energia em forma de memória de tempos já passados.

Encontravam-se ali todas as gerações, desde as de berço até à melancolia da solidão que já teve gente ao seu lado.

Hoje é um lugar quase só para turistas. E os bancos então ocupados pela sabedoria de um velho carregado das rugas da vida, deram origem a lugares vazios de memória, estranhos para quem de novo ali chega, acolhidos que não foram por quem conhecia tudo aquilo como se do seu própio corpo se tratasse.

Inveja

Como tantas e tantas vezes invejo as mulheres. Possuem o maior privilégio de um ser humano - gerar uma nova vida bem dentro do seu corpo.

Tocou o telefone. Admirei-me porque tinha acabado de me ligar. Minha mulher gritou do outro lado da linha "Nino! Um dos bébés mexeu-se!". Imaginei-lhe o rosto estampado com o decalque da felicidade suprema. E então? que sentiste? Não sei dizer, é estranho. Respondo eu por ela. Sentiu-se viva, tão viva que a sua vida está a ser capaz de gerar outra, diferente de si, mas com uma boa parte do que é.

Que inveja, meu Deus.

quarta-feira, 25 de janeiro de 2006

Cidade desconhecida



Reencontrei ontem um amigo de adolescência que, fruto do seu recente casamento passou a estar mais ausente da minha vida. Recordámos os velhos tempos - nem bons nem maus, apenas velhos - num bar que costumavamos frequentar com assiduidade. Passou a morar num lugar chamado Polima - a nossa toponímia está cheia de nomes esquisitos - que dista cerca de 20 Km de Lisboa.

O melhor epíteto que encontrou para definir a sua nova morada foi "província". Segundo diz, existem pessoas a viver da criação de gado, da agricultura e da pastorícia. Contava-me como, na celebração da Santa Missa se encontram pessoas com o rosto cavado de vales criados pelos rios de suor que escorrem pela face, mãos rasgadas pelas farpas de uma enchada que se levanta, olhar cheio de um saber humilde, mas sábio e falar arranhado por vocábulos estranhos.

Por momentos reflectimos como tão pouca gente conhece o país onde vive. Um país tão estranho quanto torna possível a existência de pessoas cujo único sustento provém da Mãe Natureza e que constantemente são invadidas pelo barulho ensurdecedor de uma cidade que grita ali mesmo ao lado. É com esse murmúrio constante proveniente de Lisboa que aqueles homens e mulheres se levantam quando o Sol nasce levando consigo a simplicidade de uma enchada e se deitam quando o Sol se põe com o suor de uma terra que se cavou.

A maior cidade do país tem mesmo ao seu lado formas de vida iguais a um tempo que já não deveria ser. E a pergunta que fica é se aqueles que todos os dias correm de um lado para o outro imaginam sequer que possa existir, ali mesmo ao seu lado, alguém que não sabe o que é um computador, um telemóvel, o MSN ou a Internet. Mas, pior ainda, é que não são esse homens e mulheres simples que se sentem invadidos e incomodados com a presente da gente urbana que chega. É a gente urbana que se sente incomodada com a presença daqueles homens simples num espaço que adoptam como definitivamente seu.

Fui por isso buscar aos meus arquivos esta fotografia de um pescador de Cascais. Por entre os carros de luxo, roupas caríssimas e televisores plasma, ainda há gente que resiste a todas estas solicitações do mundo moderno e se lança na aventura de um mar sempre desconhecido e incerto. E é espantoso como essa gente que sempre ali viveu, subsistiu e até acolheu estes novos seres estranhos oriundos da cidade se transformam num abrir e fechar de olhos em personagens caricatas e pitorescas, quase atracção de um turismo baseado na bucolidade desta nossa cidade de Lisboa.

Desaparecerão, mais cedo ou mais tarde, da nossa vista. Oxalá não desapareçam da nossa memória.

terça-feira, 24 de janeiro de 2006

Caminhar



Recupero esta foto obtida há quase um ano. O meu antigo Prior apresentava, vejo hoje, os primeiros sinais da doença que mais tarde se veio a manifestar de forma trágica, com consequências para toda a sua vida futura. Não posso deixar de pensar nele quando recupero estas fotos mais anigas.

Foi o grande responsável por trazer de volta o meu gosto pela fotografia e, acima de tudo, foi ele que me ensinou que fotografamos o que nos apetece, sem nenhuma preocupação que não a nossa sensibilidade, direi assim, artística.

Nenhum de nós teve alguma vez a pretensão de ser Fotógrafo com F maiúsculo. Limitávamo-nos a levar o nosso equipamento e fotografar a nosso belo prazer sem pensar sequer o que dali iria sair. Foi o descobrir que, mais que no resultado, para um amador o encanto da fotografia está na descoberta do mundo que nos rodeia através do seu olhar único.

Talvez por ser o último passeio que efectuei com ele o recorde com maior fervor e saudade. Mas também, não posso deixar de o dizer, por esta temática do caminho ser para mim motivo de reflexão constante desde que me converti ao Catolicismo.

Caminhar é uma das palavras que mais recorrentemente se diz nas homilias, nas catequeses, até nos Evangelhos. Não pode ser por acaso. De facto, é quando nos pomos ao caminho que encontramos a realização dos nossos objectivos quer profissionais, afectivos ou religiosos. Sem caminhar num qualquer sentido, jamais chegaremos ao destino que nos espera ansioso.

Podemos ficar sentados, à espera de uma boleia apanhada num qualquer comboio com destino incerto, levando-nos para onde ele quer. Ou, ao invés, podemos sair pela porta caminhando pelos nossos próprios pés pelos trilhos que escolhemos. E se por vezes, a boleia que apanhamos de alguém é importante para reencontrarmos o trilho certo, é na escolha do nosso próprio caminho que nos transformamos em seres plenos e cheios de vida.

Imfelizmente para alguns, como no caso do meu antigo Prior, infortúnios os levam a percorrer caminhos dos quais nem sequer têm consciência estarem a percorrer. É o acaso da doença que o guia agora, com tudo o que de trágico isso representa. Deus queira possa algum dia voltar a reconhecer-se como pessoa e com isso reconhecer o mundo que tantas vezes viu através da sua objectiva.

Último Entardecer do Ano



O mar e a praia, sempre que se misturam, provocam em nós uma comiseração intensa, como que revivendo os temas de um Romantismo que já passou, mas que, intrinsecamente, todos somos convidados a viver aqui e além.

Era o último dia do ano, sem perceber se o ano que se aproximava seria a continuação de um projecto de vida ou, pelo contrário, o início de uma nova etapa, pouquíssimo semelhante à anterior.

Ali mesmo ao lado a solidão de um pescador, sem saber se lhe havia de dar o epíteto de desportivo ou não. De cada vez que olho para um daqueles homens imagino sempre a enorme solidão em que se encontram, mas, ao mesmo tempo, no prazer que deve ser poderem, naquela tranquilidade e serenidade, encontrarem-se consigo próprios na busca de uma identidade do que são. Por momentos invejo-os. Vivemos quase sempre tão intensamente o tempo que raramente temos possibilidades de parar, acção indispensável para que se possa entrar em nós próprios. E aqueles homens dão parte da sua vida para esse parar, esse escutar-se a si próprio e, se fôr o caso, escutar a voz de Deus que constantemente nos fala e interpela.

Antes de disparar parei por momentos e foi impossível não trazer ao pensamento a minha família. Minha querida mulher a descansar no leito do nosso lar, os bébés que lutam desesperadamente pela vida ainda no ventre materno, meu Pai que tanto se esforça para dar aos seus o melhor que a vida pode dar, minha Mãe que apesar de todos os defeitos ama os seus filhos mais que à própria vida, minha querida Sogra que, apesar das dificuldades financeiras com que já viveu, continua a sorrir, minha falecida Avó materna que se derretia por cada vez que abraçava os seus netos, meus irmãos, minhas cunhadas, o meu cunhado que ali me acompanhava na jornada fotográfica e os meus dedicados amigos com quem passei tantas vezes aquele mesmo dia noutros anos. Todos eles, à sua maneira, deixaram e deixam marcas que fazem de mim tudo o que sou como pessoa.

O mar à minha frente indicava-me como o caminho é infinito, mas, ao mesmo tempo, incerto. E esta incerteza da vida só nos deixa duas formas de a viver. Ou a passamos a lamentar, a chorar aquilo que ainda não temos ou que perdemos, ou, por outro lado, apontamos a direcção do horizonte como nosso horizonte, e a levamos com confiança, com a certeza de que tudo está bem enquanto por cá estivermos.

Há momentos em que a vivo a lamentar. São os momentos da incerteza do que a vida nos reserva, do descontrolo na direcção que tomámos, da incapacidade de parar. Ultimamente tenho tido muitos dias assim. Os bébés assim me deixam.
Dizemos tantas vezes como os pais são capazes de tudo para que os seus filhos vivam, mas esquecemo-nos outras tantas que há situações em que nada podem fazer. E, acreditem, a sensação é horrorosa. Quero salvar os meus filhos, quero que eles saiam do ventre materno, quero que eles vivam, quero que eles sejam felizes mesmo que isso implique a minha própria infelicidade, mas nada posso fazer senão esperar.
Olho para a minha querida mulher ali, deitada, a fazer um esforço enorme para que a sua vontade de se mexer não se sobreponha ao desejo inabalável para que os bébés suportem as vicissitudes do seu ventre e nada mais posso fazer senão dizer-lhe com os olhos o quanto a amo.

É então que outro mar se apodera de mim, o mar que jorra bem de dentro de nós e se espraia na areia do nosso rosto.

Olho de novo para o pescador e vejo-o caminhar bem junto ao mar. Percebo então que é a caminhar que a vida se desenrola e não no congelamento de um momento registado por uma qualquer câmara fotográfica.

Disparo e recomeço a caminhar…

Ministra Alemã com 7 filhos

Infelizmente só para subscritores, não posso deixar o texto aqui - se forem membros passem no grupo Povo, mas recebi esta notícia que não posso deixar de partilhar convosco.

Num tempo onde se passa a ideia que a carreira profissional é incompatível com o papel de Mãe e Mulher, esta senhora deixa-nos um belíssimo exemplo.

A registar!

segunda-feira, 23 de janeiro de 2006

Indecente e inaceitável

Por entre o torneio Masters de Londres em Snooker que O'Sullivan perdeu, lá fui espreitando comentários e declarações políticas sobre as Eleições Presidenciais. Deixo apenas este comentário sobre esta matéria por me parecer demasiado grave para deixar passar.

Foi demasiado óbvio o objectivo da declaração de Sócrates há mesma hora de Manuel Alegre. No mínimo vergonhoso. É revelador de muitíssimo mau perder. Mas o pior é mesmo a capacidade e a leviandade com que se usa um poder - no caso o de Primeiro Ministro - para calar alguém que, no pleno exercício da sua cidadania, foi o único capaz de apresentar uma alternativa minimamente aceitável à esquerda de Cavaco Silva.

Na verdade, o que Sócrates revelou foi um tremendo desrespeito para com a instituição Presidência da República, pois achou-se muito mais importante que o cargo a que o seu (ainda) camarada se candidatou.

A Morte

Ontem, como já começa a ser hábito, fui solicitado pelo meu Prior, Pe. Jorge Dias, a realizar a Última Encomendação e Acompanhamento de um corpo até ao Cemitério de Queluz. Não foi a primeira vez que o fiz, nem será, infelizmente, a última. A morte é algo com que temos de aprender a lidar e, acredito, quanto mais a idade se vai apoderando de nós, mais a nossa capacidade de a aceitar aumenta.

Mas ontem foi muito mais intenso espiritualmente. Toda a família é Católica (isto quer dizer "praticante", porque os "não-praticantes" não são, na verdade, Católicos). Como católicos que são vivem na esperança de que Cristo é realmente a Salvação. E foi impressionante olhar para o rosto de todos eles e contemplar essa esperança, essa confiança em Deus, de que Ele está sempre presente, está sempre connosco. Se chegou a hora daquele familiar, daquela pessoa tão querida, é porque Deus determinou que o seu projecto na terra terminou, levando-o para junto de Si.

Quase não vi lágrimas, o rosto do filho, triste, concerteza, era o de alguém que acreditava que seu Pai, no momento em que se atirou o primeiro punhado de terra para a sepultura, estava junto de Deus, um Deus que vive na terra em cada um de nós e que, depois da morte, se dá a conhecer, se mostra em toda a sua força e poder.

Reflecti depois como, por causa disso, a escolha do Evangelho para a ùltima Encomendação tinha sido apropriada. Cheguei uns 15 minutos antes. Vesti a Alva, apertei o Cíngulo e peguei no Ritual. Debruçado sobre o Arcaz em frente ao Crucifixo procurei qual a leitura que escolheria. Acho que foi inspiração divina. Escolhi a ressuscitação do jovem a caminho na Sepultura em Naim. Aquele episódio da história de Cristo é um milagre, ao Seu toque o jovem senta-se no caixão. Mas hoje, esse milagre pressiste, porque, na verdade, Cristo continua a tocar nos seus filhos e vence a morte.

E era isso mesmo o que estava patente no rosto daqueles familiares e amigos, a certeza absoluta que o seu irmão estaria naquele momento a caminho do seu encontro com Deus.

sexta-feira, 20 de janeiro de 2006

A Minha Nova Paixão

Joaninha002


É esta a minha nova paixão!!! Licença de condução obtida no passado mês de Julho, moto comprada dias depois. Poderia passar aqui horas e horas a descrever porque razão as motos são um encanto, quase uma droga que jamais se quer deixar. Mas tudo o que dissesse seria pouco para conseguir descrever tanto.
Por isso, o melhor, é irem lendo os meus textos sobre as minhas aventuras e desventuras em cima da minha montada.
Ah! Tem nome. Baptizada pela minha mulher de Joaninha! Eu costumo chamá-la Bandida!

De Volta

Depois de quase um ano sem deixar um único texto aqui, decidi trazer de volta à minha vida esta página.

A razão por que o abandonei teve simplesmente a ver com uma alteração nos interesses da minha vida. A razão por que regresso prende-se exactamente com essa mesma razão. Por isso este Blogue deixará de ter contornos políticos ou de qualquer outro tipo. Será um espaço onde deixarei os textos que me apetecer sobre o que me apetecer sem nenhuma preocupação particular.

É quase como um regresso à ideia original, mas que, por inúmeras circunstâncias, nomeadamente pelo entusiasmo de então, acabou por me fugir.

Adiciono apenas a minha nova paixão - as Motos!

Até já!