sexta-feira, 28 de julho de 2006

Diário de um Pai, 27 de Julho de 2006

Ontem foi o dia dos Avós. Não o comemorámos de forma especial. Os Avós fazem parte da vida dos meninos desde o primeiro dia. Os Avós paternos são os que nos têm ajudado socorrendo quando é preciso, mimando sempre para que os pais depois sofram, estando também quando não é preciso, querendo mostrar-se mais solícitos do que na verdade era necessário. A Avó materna aparece por cá, quer-lhes pegar sob qualquer pretexto, dar um biberão, simplesmente pegar, olhá-los, tocá-los. Não tem muito jeito para a coisa, mas a sua vontade de os amar é tanta que isso, por si só, é suficiente para ultrapasar todas as dificuldades.
Eu só conheci o meu Avô paterno e a minha Avó materna. Ambos já Deus os chamou e não posso deixar de os recordar com saudade. O meu Avô paterno faleceu tinha eu cerca de 12 anos. Foi com ele que me ensinou os prazeres de um bom bacalhau regado com azetite a transbordar do prato. Era um momento de grande intimidade entre os dois. Depois de eu despachar o meu prato, puxava-me para o seu colo e dava-se ao trabalho de partir o pão, molhá-lo no azeite e dar-me-o quase à boca. Foi com ele que fiz grandes passeios pelos jardins de Queluz aprendendo os encantos da observação. E foi também com ele que, pela primeira vez, interroguei o sentido da morte. Chorei pela primeira vez com a dor da morte e percebi claramente que não mais o iria ver senão na minha memória.
Com a minha Avó materna aprendi os encantos do estômago. Era ajudante de pasteleira na Castanheira (os mais velhos desta cidade de Lisboa devem lembrar-se da Pastelaria). Passei tardes inteiras no meio das massas, ovos, tortas, bolas de berlim, bolos de aniversário avaliadas com o toque de um dedo furtivamente levado à boca. Com ela, já mais velho, compreendi o verdadeiro significado de ser Avó. É como que um renascer de uma vida dura que as rugas não deixam esquecer. É como que voltar atrás no tempo para reparar feridas antigas, mimos que se deram a menos, palmadas que se deram a mais. E agora, muito mais pacientes do que foram com os filhos por já livres do seu encargo, das pressões do sustento, dos afazeres da vida, entegam-se simplesmente ao amor pelos netos. Faleceu há cerca de 5 anos. Chorei ainda mais que na morte do meu Avô paterno. Talvez porque agora ainda mais consciente dela.
Um dia, se Deus quiser, serei Avô e poderei experimentar o prazer de o ser.

Ontem também foi dia da primeira consulta dos meninos. Confesso que me fez enorme confusão vê-los a ser examinados daquela maneira. Ela é atirar com os meninos, é levantá-los pelas pernas, é deixá-los chorar. Eu sei lá. A ideia de fragilidade dos meninos, passou a certeza de que são muito mais rijos que aparentam.
Tivemos ordem de soltura. É tempo de começar a passearmos os quatro. É tempo de eu lhes começar a mostrar o mundo, ao meu mundo, esperando que eles me mostrem que afinal, existe outro que eu não conheço.

sábado, 22 de julho de 2006

Diário de um Pai, 21 de Julho de 2006


Pois é! A vida é mesmo assim, às vezes custa muito lidar com as mais diversas situações que ela nos apresenta. Foi o que nos aconteceu ontem e hoje piorou.

Antes de ontem, 4.a feira, a Catarina começou a ficar febril. Como sempre lhe acontece, a febre atirou-a ao tapete, qual pugilista vítima do mais violento golpe do seu adversário mesmo em cheio nos queixos. E como se isso não bastasse, a febre não passou. Resultado, ontem passamos o dia no Hospital. Até que os médicos decidiram que a iam internar por detectarem sinais de uma infecção, sem conseguirem identificar onde e porquê.

Hoje a equipa decidiu que ficaria o fim de semana inteiro para observações. Devem querer saber de onde é que aquilo vem. Espero que encontrem, porque custou-me tanto deixá-la lá sem os meninos...

A enfermeira ainda perguntou se ela queria que eles lá ficassem. Mas a razão dela falou mais alto. De facto os meninos estão melhor aqui comigo. Ela está debilitada, tem qualquer coisa que nem sequer sabe o que é e, apesar de lhe irem dizendo que pode amamentar, não se sente segura. Perguntei várias vezes se tinha a certeza, não porque não quisesse ficar com os meninos (experiência que já conto), mas simplesmente porque compreendo a sua dor de Mãe. Não que a minha seja menor não estando com eles, mas simplesmente porque a dela é mais profunda, mais interior, relacionada com cordões umbilicais que nenhuma tesoura jamais será capaz de cortar.

Ontem fiquei sozinho com os meninos. Assim que cheguei a casa, fui dar-lhes banho. A minha Mãe deu uma ajuda. Primeiro o Bernardo, depois o Francisco. Enquanto estava a dar banhinho ao Francisco, a minha Mãe foi dar o biberão ao Bernardo. Depois a minha sogra, que nos veio visitar, deu o biberão ao Francisco. As duas são mães, a minha de três filhos, a da Catarina de duas meninas. A minha Mãe ainda se vai ajeitando, mas o tempo que passou foi tanto e as diferenças são tão grandes - a começar nas fraldas de paninho que eu usei - que ainda se atrapalha um bocadito. A minha sogra então não tem mesmo jeitinho nenhum. Mas enfim, as duas, com a minha ajuda, lá foram dando o jeitinho.

Pu-los a dormir. E preparei-me para uma noite longa. Nos dias que tenho estado com a Catarina não me tenho preocupado muito em acordar. A Catarina trata de o fazer e depois chama-me. Foi a forma que encontrei para poder descansar pouco, mas bem. Desligo mesmo com a certeza que a Mãe está ali e que ela me chamará quando os meninos acordarem. E ontem estava receoso que o mesmo me acontecesse, com a diferença que não tinha lá a Catarina.

Mas não. Bastava um murmúrio para abrir o olho e saltar da cama como se o meu rabo possuisse uma mola gigante, capaz de me impulsionar até à Lua. Correu tudo às mil maravilhas. Só precisei da minha Mãe já às 7h30 da manhã por estar a dar biberão ao Bernardo e o Francisco querer o mesmo. E se não tivesse ninguém para me ajudar, paciência, o Francisco esperaria um bocadito com um miminho do Papá. Dei absolutamente conta do recado. E até foi um enormíssimo teste para mim que acabou por me fazer muito bem. Apesar das suspeitas (desculpem a imodéstia), confirmei os meus dotes de Super Pai, capaz de tomar conta de dois recém nascidos sem o mínimo problema.

E ainda deu para perceber outra coisa. Que grandes são as mulheres que fazem tudo sozinhas. Fazia bem a alguns papás uma experiência destas. Recordei também o meu Pai. Educado "à moda antiga", quando foi confrontado com ter de tomar conta de três filhos, um com 10, outro com 7 e um com 1 anito sozinho durante 15 dias, foi o cabo dos trabalhos. Eu, na altura, bem me recordo, ajudei no que podia, mas só tinha 10 anitos. Ele, coitado, vivia atarantado durante todo o dia. Mas deixem-me dizer-vos. Que coisas tão belas muitos dos nossos pais perderam por causa dessa forma de estar. Hoje olho para ele como Avô e está tão diferente... É já capaz de estar com os netos, dar-lhes um biberão, até mudar uma fralda. O que me deixa a interrogação, agora que sou Pai, como serei eu como Avô?

Uma coisa de cada vez, não é? Mas, ainda assim, são perguntas que inevitavelmente não sou capaz de não procurar resposta. É que o tempo, estou a aperceber-me agora, passa muitíssimo mais depressa a partir do momento em que nasceram os meus meninos.

segunda-feira, 17 de julho de 2006

Diário de um Pai

14.07.06
Segundo dia em casa. Eu estou muitíssimo cansado. Durmo pouco e mal. Afinal por cada vez que fecho o olho, deixo os ouvidos bem sintonizados na frequência de um múrmurio, um choro. Procuro ajudar a Catarina no que posso. Mas sinto que o que posso é tão pouco…
Foi com satisfação, mas com algum medo, que recebi a notícia da alta dos meninos e da mãmã. Foi como se durante toda a minha vida me estivesse a preparar para a sua chegada e, no fim, como aluno em exame final, deixasse que os nervos, a apreensão, o desassossego tomasse conta de todo o tempo despendido no estudo.
Começamos mal. O Francisco passou a noite toda com cólicas. Fizemos o que pudemos. Passei a noite sem dormir um único minuto, tal qual a Catarina que entre a tentativa de acalmar as dores do menino tinha de alimentar o Bernardo. Eu, mais uma vez, ía fazendo o que podia. Estava à sua inteira disposição. Se queria que pegasse no Francisco para alimentar o Bernardo, se queria que mudasse a fralda, se queria que desse suplemento, se queria que lhe fosse buscar água, bolachas, um pão com manteiga, um copo de leite, de um mimo, ali estava eu, cansado mas sempre com os olhos nela, porque se eu estava cansado, imaginasse o tormento dela. Com o rapaz nem o BébéGel resultou. Teve mesmo de se conseguir desenvencilhar sozinho por entre um mimo do Pai, um beijo da Mãe ou um carinho dos dois.
Acabou por conseguir aliviar a dor, dormindo depois que nem um justo. Nem a troca da fralda, que o deixa inquieto – assim como ao irmão – conseguiu retirar-lhe o prazer de poder fechar os olhos e descansar depois de tão dura luta. Acabou por me ensinar que precisamos de ser lutadores por princípio e obeteremos a recompensa dessa luta, mais cedo ou mais tarde.

15.07.06
A segunda noite foi um pouco melhor para mim, mas igualmente dura para a Catarina. Estamos em fase de adaptação. Os meninos a nós, nós aos meninos. Eles a aprenderem a sobreviver. Demoram imenso tempo na mama. Adormecem. Acordam e dão mais meia dúzia de chupadelas. Voltam a adormecer. Voltam a acordar. Falei sobre isso à Catarina. Percebo a fixação em querer estimular os peitos para que o leite se torne melhor. Percebo os benefícios de dar peito quer para os meninos, quer até para a Mãe. Mas isso não invalida que, creio eu, a Catarina necessite de um pouco de descanso. E com os meninos a mamarem daquela maneira, é impossível ela ter descanso.
Segui o conselho da Pediatra e pedi razoabilidade à Catarina, tentando concicliar essa necessidade e opção que é dar peito, as necessidades alimentares dos meninos e as necessidades de descanso da Catarina. Dá-se de mamar, mas após pouquíssimas insistências, passamos ao biberão onde eu já posso ajudar a Catarina a descansar um pouco mais. Depois, se quiser estimular o leite, tem a bomba, até para ter noção do leite que tem, outro dos problemas que parece estar a surgir.
Os meninos estão a perder peso. Ainda tudo dentro do normal, mas a perder peso. E eu desconfio que isso se deve a duas razões. A primeira porque o leite da Catarina ainda não deve ter subido ou é de fraca qualidade. A segunda porque os meninos estão muito tempo na mama, mas, na prática, mamam pouco. Insistiremos, pelo menos nesta fase, em tentar conciliar a alimentação dos meninos com o descanso da Mãe, que é tão importante até para os próprios meninos.

16.07.06
Hoje, Domingo, passamos melhor a noite. Já nos começamos a ambientar uns com os outros, a descobrir as manhas e patranhas, as necessidades, começamos a desconfiar do choro e a reconher-lhe uma forma, parece estar tudo no bom caminho. Ontem conseguimos descansar um pouco mais e isso também se reflecte na forma como cuidamos deles. Com mais tranquilidade todas as dificuldades são superadas mais facilmente, com maior destreza e maior paciência.
Ontem fizeram a primeira birra. Ainda pensámos que poderiam ser cólicas, mas cedo descobrimos que não eram, tinham os intestinos a funcionar bem. Depois acreditámos que não estavam satisfeitos. Mas também cedo percebemos que era impossível. Conclusão, mimo dos avós, dos tios e da Tia, do Pai, da Mãe, de toda a gente… A Catarina perdeu um pouco da paciência, esboçou um ralhar, metemo-los nas camas e, depois de algum choro, lá perceberam que só lhes restava dormir e descansar. O Bernardo lutava claramente contra o sono, as pestanas caiam pesadas e ele, num esforço hercúleo, levantava-as. Bem que a pediatra do Hospital e as enfermeiras diziam que os meninos já tinham manias. Eu não queria acreditar, mas ontem, de facto, confirmou-se.
Hoje de manhã tivemos o primeiro momento só nosso depois do nascimento das crianças. Foram só cinco minutos, mas o suficiente para poder mimar um pouco a Catarina. Deixei-a descansar. Dormia tão bem que, assim que os meninos acordaram, lhes fui dar biberão para não acordarem a Mãe. Primeiro o Bernardo, depois o Francisco. Quando ela abriu o olho, já os meninos estavam comidos e mudados e pudemos dedicarmo-nos um ao outro por um bocadito. Nada de especial, um simples beijo, um abraço, meia dúzia de palavras. Talvez estes pequenos momentos possam representar muitíssimo para nós e para os meninos, agora que eles nos irão ocupar grande parte do tempo.

quinta-feira, 13 de julho de 2006

Crónica de um Pai babado

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Escrevi o que se segue no dia seguinte ao nascimento dos meus meninos. Entretanto já estão em casa. Chegaram há pouco. Têm-me ocupado o tempo e o espaço mental, todo, mesmo todo. Mas, mesmo cansado, é com um sorriso nos lábios que me ponho em pé com pouquíssimas forças e os amparo.

Acordei agora ainda mal refeito da surpresa de ontem. Estou ainda num estado de euforia que me impede de estar muito tempo parado. Sento-me aqui um pouco para vos contar as peripécias do parto.
Aproximadamente às 22h do dia 9 de Julho, depois de calmamente termos visto a Itália a vencer a França na final do campeonato do mundo, a Catarina começa a queixar-se da região lombar. Por várias vezes a tinha visto a falar com outras mães perguntando-lhes o que seria uma contracção, ao que elas respondiam, depois de enormes explicações, que ela iria saber. Não se enganaram muito. Apesar das primeiras dúvidas, até porque não estava à espera, cedo ela percebeu do que se tratava. Mantive a calma, permanecendo sempre ao seu lado e, sem ela o saber, a controlar o espaço de tempo entre cada uma.
A visão do que ela sentia, confesso, foi um pouco assustadora. Contorcia-se, queixava-se e, na primeira mais forte, chorou. Quando a vi de lágrimas nos olhos fiquei mesmo sem saber o que fazer. Mas cedo percebi que nada haveria a fazer senão permanecer ali. Às vezes na brincadeira com os amigos, costumo usar uma expressão com que a dizer que nada farei para o ajudar – dou-te apoio moral. Na verdade, a impotência com que me deparei, obrigou-me a dar outro significado à expresão, porque, de facto, é a única coisa que se pode fazer naquele momento.
Depois de ter aparecido a minha sogra – estava preocupadíssima com o nascimento dos primeiros netos – as contracções foram apertando mais, até chegar, já no carro, a 5 minutos de intervalo. Pensei, bom, não há hipótese, os meninos vão mesmo nascer hoje.
Chegados ao Hospital fez o CTG e o obstetra disse-lhe que ia demorar. Apesar de estar com contracções, elas eram irregulares e ainda não tinha sequer começado a fazer a dilatação, nem as águas tinham rebentado. Deixaram-me ficar ao seu lado o tempo todo, e eu fiquei, óbvio.
Durante a noite apenas foram uma ou duas contracções, nada de especial. Passei a noite toda em claro, apenas dormitando uma horita. De manhã nova equipa de médicos. Chegou, observou e esperou. Cerca das 11h, já com as contracções novamente a apertarem, fizeram uma ecografia e descobriram que o Bernardo estava atravessado impedindo que, quer ele, quer o irmão nascessem. Depois de estar até às 13h com dores horrorosas, pedindo-me que ficasse junto dela, chorosa, correram comigo para lhe fazerem a cesariana. Aproveitei a sugestão das enfermeiras e fui até casa, tomei um banho e almocei.
Às 13h38 nascia o Francisco com 2585 g e às 13h39 nascia o Bernardo com 2650 g.
Tal como me tinham pedido, voltei ao Hospital por volta das 14h10. Cinco minutos depois estava junto dos três, envolto numa bata azul que conservo, sei lá porquê, mas que conservo.
Mesmo impelido pelo enorme impulso de ver pela primeira vez os meus filhotes, movido pela ansiedade de os tocar, ver, olhar, sentir, tive ainda o descernimento de, em primeiro lugar, dirigir-me à Mãmã. Foi ela que teve todo o trabalho, foi ela que passou pelas dores, foi ela que lhes deu vida, que os alimentou durante 37 semanas, que os acariciou, que os sentiu, que ofereceu o seu corpo para que outros dois corpos conhecessem neste dia a luz do dia. Pedi desculpa às enfermeiras que me esperavam junto dos meninos e virei-me para a Catarina simplesmente olhando-a ternamente como que dizendo com os olhos aquilo que os lábios jamais serão capazes de dizer. Beijei-a, acariciei-lhe o rosto com as costas da mão e voltei a beijá-la na testa. Perguntei-lhe depois como se sentia, ao que respondeu com olhar feliz “tinha já outros dois”.
Como a compreendi e, confesso, como a invejei. Já várias pessoas me ouviram dizer que o dom de ser mulher, de poder gerar uma vida dentro de si, é realmente um privilégio só possível a elas. Mas ontem VI o quanto isso é verdade. E ainda compreendi melhor essa graça quando a enfermeira colocou o Francisco a mamar pela primeira vez enquanto eu segurava no Bernardo no meu colo. A sua expressão de felicidade era tão grande que não cabia na sala, nem no Hospital e, suspeito, nem no mundo. E novamente a invejei…
Estive com os três até às oito e qualquer coisa, completamente esgotado, mas com forças ainda para um jantar em família que a ocasião merecia, quase que a pensar se as minhas forças eram poucas, imaginasse as da Catarina, ganhando alento para continuar mais um pouco.
Estive sempre a seu lado e, apesar de dizer e continuar a achar que o parto, de facto, não é para homens, mas para mulheres e pessoal especializado, quando a Catarina, cheia de dores me pediu para não sair dali, seria incapaz de sair por minha própria vontade. Felizmente, para o meu coraçãozinho fraco, no Hospital S. Francisco Xavier não deixam assistir às cesarianas.
Sou Pai. Existirá maior felicidade no mundo? Hoje posso dizer que não.

domingo, 9 de julho de 2006

Diário de um Pai Anunciado - O Primeiro Anúncio

Há pouco a Catarina teve a sua primeira contracção. Estou a controlar o tempo para prevenir surpresas. Pode ser simplesmente uma contracção isolada que acontece.

Foi um pouco assustador, porque ela, que não é nada piegas, até chorou com o ataque que os meninos lhe fizeram aos rins.

Já há algum tempo que estamos preparados para isto. A cesariana está marcada para o próximo dia 19 de Julho, mas o médico obstetra avisou que poderiam nascer antes, pelo que nada nos falta para receber os meninos que estão quase, quase a ver pela primeira vez a luz do dia.

Confesso que, apesar da aparente calma, me sinto um pouco ansioso. A hora aproxima-se e é como se o chão que até agora pisei com segurança me estivesse a fugir dos pés. É um novo caminho que tenho de traçar já não a pensar em mim, mas neles. Tenho de esperar por eles para definir esse novo rumo, como comandante de navio há espera das previsões metereológicas para evitar a tempestade.

Há muito tempo que olho com carinho para as cadeiras de passeio ainda vazias, para as alcofas, para os biberãos, as chupetas, as argolas que as seguram e o albúm que espera as suas primeiras fotografias, oferecidas numa enorme manifestação de amizade pelo grupo que me tem acompanhado nas andanças motociclísticas. E com esses meus olhares procuro já dizer-lhes o quanto são importantes para mim, o quanto estarei disposto a mudar a minha vida para seu benefício, o quanto os quero já amar mais que há minha própria vida. Ao mesmo tempo, imagino-me a passear com eles, a dar-lhes a conhecer este mundo que é o meu para que se torne deles também, para que se sintam nele como em casa, no regaço de sua Mãe que os aconchega durante o tormento de uma dor. E, ao mesmo tempo, descobrir que, afinal, esse meu mundo que conheço será tão diferente com a sua presença.

Espero ansiosamente por vós, filhos!