quinta-feira, 21 de outubro de 2004

Serviço Público de Televisão


Não sou perito em comunicação, bem longe disso. No entanto atrever-me-ei, a propósito das declarações de Morais Sarmento, a fazer alguns comentários do ponto de vista de um simples espectador sobre esta polémica.
Em primeiro lugar, que significa "serviço público de televisão"?
1. Quererá dizer que se devem apresentar programas exclusivamente de índole cultural, informativa e formativa?
2.Quererá dizer que cabe na programação, além dos já referidos, programas de entretenimento, devendo apenas ser doseados no tempo de acordo com as necessidades formativas e/ou informativas do momento?
3.Quererá dizer que a RTP terá de passar todo o tipo de programas - entretenimento, formação, informação, etc. - para agradar a "gregos e troianos"?
4.Ou quererá simplesmente dizer que a RTP deve passar o tipo de programação que agrada à maioria da população?
Tenho para mim que agradar a "gregos e troianos" é impossível. Logo, serviço público não é passar todo o tipo de programas, simplesmente porque não é possível. Também considero que o povo simples não merece que o "serviço público" passe exclusivamente por uns quantos intelectuais, professores, políticos e jornalistas. Portanto, a primeira hipótese também pode ser excluída. A quarta hipótese parece-me muito mais de acordo com as leis do mercado e a segunda a mais "politicamente correcta".
Eu não entendo que a RTP, simplesmente por ser de capitais públicos, não possa ser uma espécie de empresa privada que se submeta às leis do mercado. A única condição é que respeite as regras da concorrência livre e justa. No caso de se assumir esta posição as declarações de Morais Sarmento não teriam qualquer cabimento e seriam absolutamente condenáveis por definição.
Mas parece-me evidente que o modelo definido para a RTP não é o de mercado, mas sim o de um serviço que o Estado presta aos cidadãos. Estes, por sua vez, pagam esse serviço através dos seus impostos, o que me parece uma tremenda injustiça, em tudo semelhante ao caso da educação. É que haverão muitos cidadãos a pagar por um serviço que não usam e, pior, que não querem. Como exemplo, perguntem a José Pacheco Pereira se quer pagar para ver um jogo de futebol? E, no entanto, esse jogo pode, com facilidade, ser considerado serviço público.
Voltemos à prestação de serviços pela RTP. Assumindo esse modelo, de facto, o Ministro Morais Sarmento tem toda a legitimidade para fazer as afirmações que fez. É que, parece-me, a definição de "serviço público", de tão volátil que é, tem de ser assumida pelos responsáveis da tutela pois a sociedade não é, por princípio, consensual, devendo aquela [a tutela] assumir as responsabilidades das suas decisões.
Daqui podemos concluir que, assumindo este modelo, a RTP mudará de rumo a cada eleição legislativa, a cada novo governo ou a cada novo ministro. E não me parece ser este o melhor caminho. Será apenas um adiar constante, de discussão em discussão, sem se encontrar nenhuma solução definitiva.
Em suma, ou estamos prontos a assumir a responsabilidade política de tal modelo para a RTP, com todos os custos económicos e políticos que isso representa, incluindo o facto de o Ministro da tutela afirmar que é ele quem manda na programação da RTP (não querendo com isto dizer que a pluralidade da informação possa ser posta em causa), quanto mais não seja pela nomeação dos responsáveis da empresa, ou partimos para a única solução que me parece coerente - a privatização.

P.S.: Ainda a propósito das declarações do Ministro Morais Sarmento, como muito bem afirma JMF, o problema não está nas afirmações em si, mas no contexto político em que as fez. Revelou uma tremenda falta de oportunidade que não lhe conhecia. Tenho Morais Sarmento como pessoa competente (a RTP demonstra-o), mas parece que o síndroma "Gomes da Silva" está a alastrar-se por todo o Governo, fazendo com que todos os outros andem "encostados à parede" para que não reparem neles.

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